O Brasil com Z é um blog onde vários brasileiros se juntaram para escrever sobre suas experiências sobre morar no exterior. Uma das integrantes, a Glenda, mora em Sevilha, na Espanha. E fez um texto excelente sobre voltar ao Brasil depois de ter morado fora.
“Depois de duas semanas lendo sobre o porquê dos meus companheiros de Brasil com Z não quererem mais voltar a viver no Brasil, decidi escrever meu texto. Em 2009 já havíamos feito uma ronda sobre “voltar ou não voltar” entre os colaboradores do blog… os tempos eram outros, o pessoal também, mas quem quiser conferir pode clicar aqui. Inclusive eu dei minha opinião sobre a volta e decidir escrever de novo não porque tenha mudado de ideia, mas sim porque ampliei um pouco meu pensamento“.
Morando na Holanda aprendi que se trabalha para viver e não se vive para trabalhar. Gosto da ideia de uma sociedade que permite pessoas comuns, como eu e você, que tem um trabalho normal, conseguirem tirar férias na Grécia ou na Tailândia.
Horas extras, 60 horas de trabalho semanais, um final de semana em casa atolado de prazos esgotados? Óbvio que isso acontece, mas não é uma obrigatoriedade para se ter uma vida minimamente digna e confortável. “Conheço funcionários públicos que pedem redução de salário para poder ficar uma hora a mais com os filhos em casa”, disse a Glenda.
E o transporte: como era no exterior?
Vivendo na Holanda, assim como a Glenda na Espanha, eu aprendi que carro não deveria ser um item básico, mas um luxo. Carro é pra ser usado naquelas distâncias mesmo longas, tipo viagens de uma cidade pra outra.
Sabe porquê? Porque onde o transporte público existe, funciona e tem preço acessível em grande parte do país. Me assustei no começo com o preço dos ônibus na Holanda quando morava em Wageningen, mas eles vinham no horário certinho, tinha aquecimento e ar-condicionado dependendo da estação, era seguro (isso vem de todo um contexto social de igualdade que o Brasil não tem), porém não era 24 horas. Como qualquer serviço, é claro que tem defeitos, mas comparado com a qualidade de Piracicaba é absurdamente melhor.
No meu caso em particular, na Holanda, a bicicleta é uma alternativa de transporte realmente viável, não apenas um luxo de alguns grupos ousados de pessoas, como no Brasil. Ciclovias estão presentes na Holanda na totalidade do território, mas em outros países elas também facilitam a vida de estudantes, trabalhadores, mães… No Brasil a ciclovia tem menos destaque nas políticas públicas por diversos motivos, entre eles o modelo de desenvolvimento do transporte do país, que foi dominado pelo carro e caminhão, com pouco investimento em ferrovias ou outros meios de transporte locais. As hidrovias se destacam também em algumas regiões do nosso país.
Em Sevilla, nossa amiga Glenda pedalava 40 minutos até o trabalho, e olha que “Sevilla não é uma cidade pequena, tem quase 800 mil habitantes fora a zona metropolitana”. Na Holanda, eu pedalava 10 minutos na beira da rodovia, de casa até a faculdade em Wageningen. Ops, correção: Na ciclovia que beirava a rodovia! Com a liberdade de poder ouvir uma música no fone, porque afinal não tenho que me preocupar em ser atropelada. Realmente faz diferença poder ir e vir com o ventinho no rosto, se exercitar, e ainda economizar. O dinheiro que eu usaria de ônibus por mês pode ser guardado para uma viagem – ou simplesmente pra comer melhor.
Convivências no exterior
Em um ambiente internacional, cheio de outros imigrantes, aprende-se a tolerância, o que ajuda a esquecer um pouco a hierarquia social. Vivemos no mesmo prédio do entregador de pizza, da faxineira, e do seu chefe. Sim, seu chefe. Compramos no mesmo mercado, e comemos no mesmo restaurante.
Pelo menos na teoria isso funciona, mas a Europa tem defeitos, assim como no Brasil. A Alemanha tem sua história recente com o nazismo e ainda luta contra o neonazismo e neofascismo. Por toda a Europa, existem exemplos de intolerância e ideologias de ódio. Assim como no Brasil. Porém, em alguns países existem governos com políticas públicas de tolerância, onde as pessoas tem mais liberdade de lutar pelos seus direitos.
Glenda conta sobre a sua experiência na Espanha: “O normal pode ser qualquer coisa, que cada pessoa é um mundo e que cada um de nós cuida do seu próprio mundo pessoal, sem precisar de aparências ou máscaras. E ao mesmo tempo aprendi que todos devemos cuidar do nosso mundo coletivo, que a força do ser em conjunto é muito importante e que, melhor de tudo, dá resultados”.
Qualidade de vida acessível a um bolso pouco cheio ou um bom trabalho (ou um trabalho qualquer)?
“Enfim, todo mundo deveria ter a oportunidade de sair da sua bolha, ver o mundo com outros olhos, aprender novos valores e, quem sabe, voltar e conseguir lutar por um lugar melhor. O Brasil é um país com duas caras, lindo e horrível ao mesmo tempo. Sei que sou uma privilegiada por ter oportunidade de estudar o que eu gosto. Adoraria poder voltar e tentar fazer do meu Brasil um lugar melhor para se viver, mas ao mesmo tempo me sinto muito ingênua em pensar que isso poderia ser possível. Ninguém tem a resposta e não sou a única em duvidar do “desenvolvimento” do Brasil“. -> Definitivamente ela não é a única.
“Embora muita gente siga pensando ao contrário, dinheiro não é e nem nunca foi garantia de felicidade. Felicidade para mim é isso, poder levar a vida sem pausa, mas sem pressa, sem paradeiro se eu assim quiser. Posso não estar com os bolsos cheios, mas percebi que não necessito nada disso para ter uma vida confortável, surpreendente e divertida“.
Fatores emocionais como amores e amigos também fazem parte da nossa tomada de decisão. Sua condição social também. Pra mim, vale a pena aproveitar a oportunidade de viver em um lugar que parece mais justo do que o lugar onde eu nasci.
E aí, qual a sua opinião?
Fonte: Brasil com Z.